Monday, August 02, 2010

sobre amor

"Existimos, a que será que se destina?" perguntava ela, ainda com o olhar preguiçoso amassado no travesseiro, e ele só sabia dizer que lhe amava. Enquanto passeava com os dedos pelos cabelos do peito, pensava que devia mesmo aquilo ser amor. Uma vontade de permanecer junto. Pertenciam suas vidas muito mais a esfera dos acontecimentos crus e ao entretenimento vazio, já não conheciam aquela ciranda de floreios recém-encontrados. Enquanto caía a tarde, entrava pela janela uma luz difusa e gostosa. Se encontravam em fotografias, nos cantos da casa, em copos de cerveja, quando, num desses momentos decisivos da vida, de boca seca e coração disparado, perceberam que já, certamente, pertenciam um ao outro e que nada restava senão ousarem viver aquele amor fresco como aquela mesma manhã de sábado em que tudo começou.


Friday, July 09, 2010

closer

ela, que era de porcelana, sonhava com o dia em que poderia finalmente dizer aquela frase mais legal daquele filme mais legal dos últimos tempos.

'don't love you anymore... goodbye'.

porque todo mundo vinha com essa frase pra cima dela, e ela sempre acreditava que poderia esquecer um amor tão podre que já estava a ponto de cair do pé.
Um dia, reviu o filme, e achou que cabia muito mais no contexto uma outra sentença que a sentenciaria a sonhar por mais alguns minutos.
'it's only over when it's over', acreditou de novo em ilusões e rabiscou um sorriso na cerâmica da cara já gasta com o tempo.

Thursday, July 01, 2010

ladeiras

Tinha uma hora que sempre chegava, mas em que ela não acreditou. não dessa vez, porque era diferente, até a música caía diferente, como se fossem os acordes delicados pingos de chuva no chão daquela ladeira, aquela já tão longe, mas onde havia esquecido seu coração. ela fechava os olhos pra tentar esquecer, para que demorasse a chegar, para que a dor pudesse ser adiada.
mas a hora chegou no travesseiro de outro amor, ouvindo o coração bater forte.
percebeu como doía que aquele corpo nu já não fosse mais o mesmo de outrora. não queria mais o amor ou suas histórias, aquilo bem era coisa que já não mais lhe convinha.
mentira.

ainda amava loucamente um amor que nunca lhe dera nada em troca, a não ser a promessa de amá-la de volta e, mesmo sem entregar-se, a fez apaixonar-se tão loucamente a ponto de esquecer-se diariamente de toda a desilusão que esse mesmo insistente amor já causara. mas, ao acreditar que essa história infeliz longe estava de terminar, decidiu que a partir dali não lhe restava outra saída senão chorar o silêncio e se esconder debaixo do edredon em dias nublados.
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Lay your head where my heart used to be
Hold the earth above me
Lay down in the green grass
Remember when you loved me -
- cibelle, green grass.

Sunday, June 27, 2010

sábado

Era uma daquelas histórias de amor que já começaram dando errado, mas ele não me deixava ir embora. Me segurava na cama, dizia, 'só mais cinco minutos', e eu, como boa preguiçosa, deixava me envolver por aquele calor nas costas, beijos na nuca e a bagunça dos lençóis. E me amava baixinho, mesmo sabendo que eu era uma daquelas histórias que davam errado - e ainda hoje me pergunto como foi que deu certo. Sobre o não-amor, o que me explicaram é que, quando nos sábados de manhã, céu cinza, calor lá fora e a preguiça na cama, uma conversinha no pé do ouvido nos faz sem querer se apaixonar. Sem querer o querer, mas já o querendo, foi assim que eu quis aquele querer infindo e preguiçoso das manhãs de sábado.

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Monday, June 21, 2010


com pressa, sem medo: a verdade falada no silêncio de duas bocas.

Tuesday, June 08, 2010

arrête là, menina

Ando nua pela casa porque tenho preguiça de me vestir. Tenho preguiça de definir meu humor, decidir minhas indefinições, escolher com que música dançar. Prefeiro pegar o carro e correr até teus lábios. quando éramos, andávamos pelados pela casa, exibindo curvas duvidosas, pele sobrando e um pouco de sensualidade. ainda nos amávamos, e era tão bonito porque aquelas bundas passeavam por todos os metros quadrados sem vergonha e isso significava tanto pra nós como tomar um café e jogar conversa fora na mesa da cozinha. naquele outro dia, quando voltei lá, fazia frio e você me cobriu. não andamos mais nus por aí porque já não nos sentimos mais bem. aliás, não nos sentimos, eu não me sinto, nem sei mais o que sou e não sei escolher roupas ou sapatos ou a maneira de me comportar diante do nosso fim. eu prometo por toda minha vida ser somente tua, eu cantei, você no piano, o encontro de duas peles nuas quentes. era mentira. mentira porque eu nunca soube que nunca teria a oportunidade de entender porque não somos mais dois, e agora só corpos cobertos trabalhando, andando pelas ruas lotadas, amanhecendo nas xícaras de café, correndo para pegar ônibus. eu não gosto dessa realidade, da vida cotidiana, do barulho dos carros. eu gosto de imaginar domingos sentados na chão da sala, despidos em cima do tapete, ouvindo aquela música suave e baixinha, pode ser dave brubeck, pode ser cibelle, você escolhe, chove e entra pela janela uma luz úmida e difusa como nosso amor. imagino também leves toques no piano, eu canto, você me ama, e vivemos os dois simbioticamente sem roupas e sem os pesadelos da rotina.
mas anda muito difícil sentir. esboçar qualquer sentimento, sentir, sabe, aquela coisa que aperta o coração e depois você sente quente dentro. não sinto mais, cortei meus cabelos, minhas unhas e fui embora já sem o coração: deixei nu, sobre o piano, dentro de uma xícara de café, todo pra você, mas agora quero de volta - me mande no primeiro ônibus que puder, ok? e venha junto. sem os compromissos da rotina, sem indefinições, sem tristezas guardadas e - principalmente -sem roupas.

Monday, May 24, 2010














17.04

"As pessoas são uns lindos problemas" (sérgio sampaio)

Voltou a chover na nossa pacata ilha.
Numa dessas tardes meio frias, foi até a prateleira de discos e - coincidentemente - encontrou seu mais novo estado de espírito estampado na capa de um cd:
Hoje não!
Era mais fácil lembrar da saudade e esquecer-se dos lindos problemas, mas nesses dias difusos as coisas parecem bem mais complicadas...
Derramou uma xícara e café sobre suas promessas, sujou a mesa de vontades e correu para dar o play. Sentada no piso frio podia sentir chegar a solidão, que, hoje sim, viraria sua única companheira para as noites vazias.

Tuesday, May 11, 2010

sobre saboneteiras

dentro do quarto estava um pouco quente, mas lá fora chovia, chovia e chovia. Há uma semana, os dias eram molhados e o centro mais e mais sujo. Mas era uma manhã de sábado e ele disse que não acreditava em histórias de amor, sendo aquela uma das tais, que terminasse, e emendou um grito feio no fim da frase para fazer efeito. Funcionou, tanto que ela foi embora e deixou um buraco do peito dele. Mas não havia escolha; decidido, acabou.
O banheiro da casa era grande e mal iluminado. Gostava do banho quente, muito quente, "porque é mais gostoso", e ao buscar pelo sabão, encontrou aquela saboneteira branca e suja com aquele maldito sabonete de morango dentro.
A saboneteira era dela - e era ela, ali, desmoronando-o.
No estômago, sentia aquela sensação estranha, como se as borboletas todas resolvessem voar juntas pra bem longe dali. Fechou os olhos, sentiu a água cair e pensou: 'maldita cerveja'. Era só ressaca.
Guardou a saboneteira suja na gaveta e colocou um Lux na prateleira do box.

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Sunday, May 09, 2010


bate uma saudade dessa vista.

uma vez,

lembra?

você lembra? aquela pergunta que faço todos os dias, "queria que você entendesse a falta que me faz ouvir sua voz", ninguém nunca entende nada do que eu digo!
São dias corridos, amontoados um em cima do outro.
eu disfarço minha falta com olhares furtivos e amores vazios. disfarço minha rotina, escondo as horas vulgares. nem assim...

lembra?
escrevíamos coisas loucas todo o tempo, você gostava de não brigar comigo e me ver chorar no fim de noite. gostava pelo exagero na repetição, não gostava? eu lembro que era sempre sábado a tarde, e nós tomávamos banho de cachoeira... lembra, agora não mais um dia tão longe, dois, três meses atrás, lembra?

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vem no vento, vem no vento
pensa na beira do mar
me deixa chegar
que venham as flores, o cheiro de mar
(cibelle)

Monday, April 26, 2010

começa inverno,

tinha 22 anos e acreditava que, realmente ali, naquele ponto da vida, o amor havia chegado pra ficar. sonhava com casamentos, vestidos de noiva e evitava viver seu romance ao fantasiar da vida de outras pessoas. é que ela gostava de pegar emprestado as pequenas gotinhas de sonhos derramadas por aí em livros, filmes e músicas e guardar só pra si. mas eu, olhando assim pra ela, naquela luz de fim de noite, achei que ela era triste e só. de repente, no meio de uma gargalhada gostosa, ela percebeu que havia finalmente chegado o fim, aquele triste e doído fim que também está nos livros, filmes e músicas. pintou o céu de cinza, desistiu do amor, do véu e da grinalda e "nunca mais conseguiu encontrar o amor", porque era fatalista e achava que, àquela altura, no auge dos seus quase 23 anos, a vida já tinha decidido os próprios caminhos.

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Tuesday, March 09, 2010

em três pulsos do telefone, ouvia a cor do seu cabelo brilhar de longe.
"como vai? você nao vem?", ingênua.

ele nao vinha.

em meio a todas aquelas fotos, maresia, estômago embrulhado e meia decisao tomada. ela queria andar de patinetes, ouvir música alta no carro, batucar na mesa com cerveja pra acompanhar. tomar chuva: quanto tempo. queria correr pelada por um campo cheios de girassóis da cor do sol, ou da cor do seu cabelo que brilha... ou quem sabe só dividir um capuccino nesta tarde fria. e poder viver sem despertador, sabe: queria acordar sozinha depois de aaaanos sem férias. era férias, finalmente, e o maldito nao vinha.

Sunday, March 07, 2010

nossa, como é difícil manter um blog!

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quanto tempo mesmo passou? a gente passeia por aí, em meio ao sol e à chuva e nem lembra disso: que passa tanto tempo sem a gente mesmo passar. Passa assim, como passam preguiçosos e arrastados os domingos cheios de olheiras, como passamos por aqui e por lá, como chegamos e deixamos lares, lembranças e a felicidade que se encontra nas horinhas de descuido. e quando chega março, foram tantas fotos, tantas praias, tanta alegria incompreendida: passou. e acabou numa xícara de café em qualquer lugar impessoal, eu e o mundo e os devaneios sobre o futuro incerto que cai todos os dias sobre nossas cabeças.

o amor, talvez, seja muito mais difícil que pareça e, quem sabe, também passe.